KinoSearch (Search Engine)

Marcio Ferreira
Publicado em 01/03/2011

KinoSearch (Search Engine)

 Um erro é simplesmente outro modo de fazer as coisas.
                                                    --Katharine Graham

 Ciência é o que entendemos bem o suficiente para explicar a um computador.
 Arte é qualquer coisa que fazemos além disso.
                                                        --Donald Knuth

Objetivo desse artigo é desmistificar um pouco Full Text Search, apresentando o engine de busca KinoSearch. Utilizo o KinoSearch como exemplo, mas apresento também há referências a outros engines igualmente interessantes, além de abordar brevemente o funcionamento do Full Text em banco de dados. Esse artigo originou-se da necessidade de tornar minhas consultas mais eficientes.

Caso o leitor tenha crítica/dúvida, por favor comente no fim do artigo - contribua. ;)

Consulta por texto

Apesar de haver diversas formas de armazenamento de dados, o banco de dados relacional é de longe a solução mais implementada. Porém quando nosso input corresponde a uma longa cadeia de caracteres, é interessante sabermos como o banco de dados relacional armazena e recupera os dados.

Quando consultamos um banco buscando sempre pelo mesmo campo de uma tabela, é conveniente criar um índice para esse campo. Índices agilizam a obtenção da informação, pois guardam o conteúdo do campo de forma ordenada e otimizada. Assim, ao invés da consulta ser realizada diretamente na tabela, o índice é usado para saber de antemão os registros realmente pertinentes. Índices são muito interessantes para agilizar consultas em campos com valores

Porém em um campo do tipo TEXT, no MySQL por exemplo, ocupa 65.536bytes, você pode criar um prefixo ao índice(por exemplo 10 primeiros bytes da string), porém fica limitado a consultar pelo início da string , o que torna essa implementação de índice não eficiente para a maioria dos casos.

Operador LIKE

Imaginemos uma tabela com 100 mil registros, onde uma consulta é realizada em um campo TEXT. Sem a utilização/existência de um índice, os 100 mil registros serão visitados e comparados com o valor da expressão LIKE. Essa implementação não faz qualquer otimização na consulta. O que torna a pesquisa lenta a medida que se acrescentam registros.

Full Text Search e Índice Invertido

Full Text Search é uma técnica de pesquisar texto em documentos ou banco de dados.

A forma mais eficiente de indexar esse tipo de conteúdo é utilizando o que chamamos de Índice Invertido. Em resumo, é criar uma lista de todas as palavras da string referenciando suas respectivas posições no texto original.

Imagine que temos os registros:

 R  = "Estamos falando de Perl Moderno"
 R¹ = "Hoje em sua 12 versão, o Perl 5 moderno é uma linguagem de uso geral"
 R² = "Perl moderno a escolha certa para um projeto tão ambicioso e multifacetado"

O índice gerado considerando stop words, teria essa cara:

 "estamos":       {(0, 0)}
 "falando":       {(0, 1)}
 "moderno":       {(0, 4), (1, 8), (2, 1)}
 "perl":          {(0, 3), (1, 6), (2, 0)}
 "hoje":          {(1, 0)}
 "versão":        {(1, 4)}
 "é":             {(1, 9)}
 "linguagem":     {(1, 11)}
 "uso":           {(1, 13)}
 "geral":         {(1, 14)}
 "escolha":       {(2, 3)}
 "certa":         {(2, 4)}
 "projeto":       {(2, 7)}
 "ambicioso":     {(2, 9)}
 "multifacetado": {(2, 11)}

O primeiro número corresponde ao registro e o segundo a posição do termo no registro. Assim quando criamos um índice, estamos efetivamente criando tokens com o lexema do texto original.

No Banco de Dados

O PostgreSQL possui um tipo de dado para trabalhar com Full Text, tsvector, e os tipos índice são GIN e GIST. O GIST pode gerar falsos-positivos, uma vez que seu índice é baseado em bits aleatórios. O GIN, por sua vez, é mais preciso e oferece um desempenho melhor que o GIST, perdendo apenas durante o processo de atualização do índice.

É possível criar um índice de campos compostos:

 CREATE INDEX pgweb_idx ON pgweb USING gin(to_tsvector(config_name, body));
 [...]
 WHERE to_tsvector(config_name, body) @@ 'a & b'

É possível ainda concatenar campos:

 CREATE INDEX pgweb_idx ON pgweb USING gin(to_tsvector('english', title || ' ' || body));

Como o banco trabalh com o índice em memória, o desempenho do índice degrada e o consumo de memória aumenta consideravelmente conforme o volume de texto.

Não é possível inserir direto no campo tsvector (workaround: trigger para automatizar o update).

tsvector suporta menos de 2 kb por lexema e 1 mb por lexema com as posições.

 SELECT title
 FROM pgweb
 WHERE to_tsvector('english', body) @@ to_tsquery('english', 'friend');

Nesse exemplo, convertemos um campo text para tsvector (tipo de dado que suporta o índice) com o to_tsvector, para buscar o termo "friend". @@ é o operador de consulta em um campo tsvector. O dicionário padrão é 'english'.

to_tsquery e plainto_tsquery convertem a query para tsquery. to_tsquery é menos preciso que plainto_tsquery, não considera stop words por exemplo.

PostgreSQL possui dicionários em várias linguagens. É possível configurar os termos ignorados no índice, customizar seu próprio dicionário, sinônimos e lexidade.

Engines

A melhor forma de obter bons resultados com Full Text Search é usando engines projetadas para armazenamento de texto.

LUCENE - Solr

É a engine mais difundida. Desenvolvida em Java, possui alta performance. É capaz de indexar documentos em diversos formatos(PDF, HTML, Microsoft Word e OpenDocument).

Sphinx

Desenhado para trabalhar em conjunto com banco de dados.

Plucene

Esse engine é um port do Lucene para Perl

Kinosearch

Versão do Lucene portada para C compilado para Perl. Seu desempenho é semelhante ao Lucene. Para instalar via CPAN:

 cpan KinoSearch

Por ser em Perl, não há qualquer pré-requisito para usá-lo, a não ser instalar o próprio módulo. Além de possuir ótimo desempenho e ter baixo consumo de memória, é simples de ser usado/configurado.

Criando um Índice

O KinoSearch permite configurar vários tipos diferentes de índices. Abaixo, detalho um pouco sobre a criação e consulta dos índices:

KinoSearch::Schema

Parametriza o schema do índice.

 my $schema = KinoSearch::Schema->new;
 $schema->spec_field( name => $field, type => $datatype );

O datatype pode ser: BlobType (dados em binário) - opção padrão -, FullTextType e StringType - para busca em campos de valores exatos.

O FullTextType merece um pouco mais da nossa atenção. Há configurações específicas nesse campo que personalizam a forma de utilizá-lo.

 my $type = KinoSearch::Plan::FullTextType->new(
                analyzer      => $analyzer,
                boost         => 2.0,
                indexed       => 1,
                stored        => 1,
                sortable      => 1,
                highlightable => 1,
            );

analyzer - Agrega o "Analizador" do campo, por exemplo idioma, stopword, normaliza o case.

Com KinoSearch::Analysis::* se faz tais configurações;

boost - float, precisão do campo;

indexed - boolean se o campo deve ser indexado;

stored - boolean se o campo deve ser armazenado;

sortable - boolean se o campo deve ser ordenado;

highlightable - boolean se o campo pode destacar termos.

KinoSearch::Indexer

Constrói o index, com ele parametriza-se a criação do index.

 my $indexer = KinoSearch::Indexer->new(
                   schema   => $schema,
                   index    => '/path/to/index',
                   create   => 1,
                   truncate => 1,
                   manager  => $manager
               );

 while ( my ( $title, $content ) = each %source_docs ) {
     $indexer->add_doc(
         doc   => { field_name => $field_value },
         boost => 2.5,                # default: 1.0
     );
 }

 $indexer->commit;

schema - define o schema;

index - caminho para o índice a ser consultado;

create - boolean se o index deve ser criado fisicamente;

truncate - boolean se o campo deve ser "truncável";

manager - boolean se o campo deve permitir futuras reconfigurações;

add_doc() - Esse método adiciona um documento no índice, bastar definir o nome do campo e seu valor no atributo "doc" e o "boost";

optimize() - Otimiza o índice para um tempo de busca menor;

commit() - Grava as alterações no índice.

OBS** O tamanho do arquivo de índice criado é semelhante a uma tabela exportada (COPY) do PostgreSQL. Os metadados são armazenados em JSON, o que é um ponto positivo.

KinoSearch::Analysis::PolyAnalyzer

Parametriza a criação de cada campo, isso determina o que será possível fazer com o campo. Todos os tipos de campos podem usufruir desse recurso.

 my $case_folder  = KinoSearch::Analysis::CaseFolder->new;
 my $tokenizer    = KinoSearch::Analysis::Tokenizer->new(
                        language => 'pt'
                    );
 my $stemmer      = KinoSearch::Analysis::Stemmer->new(
                        language => 'pt'
                    );
 my $polyanalyzer = KinoSearch::Analysis::PolyAnalyzer->new(
                        analyzers => [
                            $case_folder,
                            $whitespace_tokenizer,
                            $stemmer,
                        ],
                    );

Consultando

KinoSearch::Searcher

Classe para busca nos documentos.

 my $searcher  = Searcher->new( index => $index );

 my $sort_spec = KinoSearch::Search::SortSpec->new(
                     rules => [
                         KinoSearch::Search::SortRule->new( field => 'date' ),
                         KinoSearch::Search::SortRule->new( type  => 'doc_id' ),
                     ],
                 );

 my $hits = $searcher->hits(
                query      => $query,
                offset     => $offset,
                num_wanted => $limit,
                sort_spec => $sort_spec,
            );

 while ( my $hit = $hits->next ) {
     print $hit->{$field}
  }

  print $hits->total_hits;

Na instância do objeto já se define o índice que vamos trabalhar.

query - consulta, exemplo: "field_name:$field_value";

offset - offset da consulta;

num_wanted - limite de resultados na consulta;

sort_spec - forma de ordernar o resultado;

next - percorre o conjunto de resultados;

total_hits - total de documentos retornados;

KinoSearch::Highlight::Highlighter

Esse módulo personaliza o retorno da busca, dando realce no resultado. Ele assume um padrão de HTML para os destaques, <strong> por default.

 my $highlighter = KinoSearch::Highlight::Highlighter->new(
                       searcher       => $searcher,
                       query          => $query,
                       field          => 'content',
                       excerpt_length => 150,
                   );

 my $hits = $searcher->hits( query => $query );

 while ( my $hit = $hits->next ) {
     print $highlighter->create_excerpt($hit);
 }

field - campo que queremos realçar em nosso match;

excerpt_length - tamanho máximo do trecho retornado, em caracteres;

create_excerpt( $Obj ) - retorna o trecho a ser destacado.

Search::Query::Dialect::KSx/Search::Query

Usando o Search::Query é possível consultar o dialeto KSx no momento da busca. Esse recurso permite pesquisar via wildcard;

 use Search::Query;
 my $query = Search::Query->parser(
                 fields      => { $field => { analyzer => $analyzer } },
                 query_class => 'KSx',
                 field_class => 'Search::Query::Field',
                 query_class_opts => { default_field => [$field], },
             )->parse( 'processo* +administrativo* -contratante' );

A string de consulta gerada:

 txt_item:processo* AND txt_item:administrativo* AND (NOT txt_item:CONTRATANTE)

query_class - define o dialeto usado na consulta;

parser() - configura a consulta;

parse() - string da consulta.

OBS** esse é o modo mais complexo de se fazer consultas no KinoSearch. Usando-o obtemos o mesmo efeito do ILIKE em SQL. Ele é escrito em XS, o que o mantém com ótimo desempenhoa, porém não suporta consultas mais complexas. Sugestão por Peter Karman, usa-se o módulo Search::Tools para esse tipo de pesquisa.

Conclusão

Como vimos, há maneiras mais eficientes de trabalhar com armazenamento de texto que armazená-lo em banco de dados relacional, mesmo havendo suporte ao Full Text em no banco, seu desempenho é muito discrepante em comparação as engines de mercado. Kinosearch é uma engine interessante, considerando sua simplicidade desde a instalação, indexação e consulta.

Referências

MySQL - http://dev.mysql.com/doc/refman/5.5/en/storage-requirements.html

PostgreSQL - http://www.postgresql.org/docs/8.3/static/textsearch.html

KinoSearch - http://search.cpan.org/~creamyg/KinoSearch-0.31/

Lucene/Solr - http://lucene.apache.org/

Agradecimentos

Agradeço à comunidade Perl brasileira pela oportunidade de contribuir com conteúdo técnico.

Ao pessoal do IRC, principalmente Lorn e lmc por deixar pistas no início da minha pesquisa.

Ao Breno pela incrível paciência e revisão desse texto.

E principalmente a Larry Wall e os mantenedores do Perl que possibilitam que meu trabalho seja tão mais fácil/divertido :)

autor

Marcio Ferreira

Twitter @_marcioferreira

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